Estabelece normas de Proteção aos Animais no âmbito do Estado da Bahia e da outras providências.
A Assembléia Legislativa
Decreta:
Capítulo I
DOS ANIMAIS DOMÉSTICOS
Seção I
DAS CONDIÇÕES DE VIDA
Artigo 1º – Ficam vedadas no âmbito do estado da Bahia as práticas de abuso, maus tratos e crueldade contra animais.
Parágrafo Único – Consideram-se animais:
I – silvestres, aqueles encontrados livres na natureza, pertencentes às espécies nativas, migratórias, aquáticas ou terrestres, que tenham o ciclo de vida ocorrendo dentro dos limites do território brasileiro, ou águas jurisdicionais brasileiras ou em cativeiro sob a competente autorização federal;
II – exóticos, aqueles não originários da fauna brasileira;
III – domésticos, aqueles de convívio do ser humano, dele dependentes, e que não repelem o jugo humano;
IV – domesticados, aqueles de populações ou espécies advindas da seleção artificial imposta pelo homem, a qual alterou características presentes nas espécies silvestres originais;
V – em criadouros, aqueles nascidos, reproduzidos e mantidos em condições de manejo controladas pelo homem, e, ainda, os removidos do ambiente natural e que não possam ser reintroduzidos, por razões de sobrevivência, em seu habitat de origem;
VI – sinantrópicos, aqueles que aproveitam as condições oferecidas pelas atividades humanas para estabelecerem-se em habitats urbanos ou rurais.
Artigo 2º – As práticas descritas no artigo anterior são assim consideradas:
I – ofender ou agredir fisicamente os animais, sujeitando-os a qualquer tipo de experiência de modo a causar-lhes sofrimento ou dano, ou que de alguma forma, lhes provoquem condições inaceitáveis para sua existência;
I – Imanter animais sem lhes fornecer abrigo e a quantidade necessária de alimentação adequada e de água limpa;
III – manter animais presos em locais que não propiciem a sua livre movimentação ou amarrados com corda ou outros instrumentos que lhes impeçam a movimentação;
IV – manter animais em locais desprovidos de asseio, que não lhes permita a movimentação e descanso, ou que os prive de ar e luminosidade adequada;
V – obrigar animais a trabalhos forçados que resulte em sofrimento;
VI – não lhes prestar assistência médica especializada nos casos de enfermidades e em função de ferimentos.
VII – utilizar ou exibir animais domésticos como objeto de diversão, bem como oferecê-los como brinde.
VIII – promover lutas entre animais da mesma espécie ou de espécies diferentes em locais públicos e privados.
IX – ministrar-lhes ensinamentos através de práticas que lhes causem dor, desconforto ou danos à sua integridade física ou psíquica;
X – utilizar em seus corpos instrumentos que lhes causem dor e desconforto visando induzi-los à realização de atividade ou comportamentos que não se produziria sem o emprego de artifícios.
XI – utilizar animais para a prática de atos libidinosos;
XII – enclausurar animais de qualquer espécie em gaiolas, jaulas ou similares para fins de ornamentação ou diversão.
XIII – manter animais com outros que os molestem ou aterrorizem;
XIV – exercitar animais conduzindo-os presos a veículo em movimento;
XV – abandonar animais em locais públicos ou privados;
XVI – qualquer forma de divulgação e propaganda que estimule ou sugira a prática de maus-tratos ou crueldade contra animais ou que vincule sua imagem a fatos negativos;
XVII – deixar de prestar-lhes assistência em caso de acidente ou atropelamento bem como atropelá-los intencionalmente;
XVIII – É vedada a prática de sacrifício de cães e gatos em todos os Municípios do Estado, por métodos cruéis, consubstanciados em utilização de câmaras de descompressão, câmaras de gás, eletrochoque e qualquer outro procedimento que provoque dor, estresse ou sofrimento.
XIX – Considera-se método aceitável de eutanásia a utilização ou emprego de substância apta a produzir a insensibilização e inconscientização antes da parada cardíaca e respiratória do animal.
Seção II
Da Prevenção de Zoonozes
Artigo 3º – Incumbe ao Poder Público manter programas permanentes de controle de zoonoses, através de vacinação e controle de reprodução de animais, em especial de cães e gatos, ambos acompanhados de ações educativas para propriedade ou guarda responsável, e ainda:
I – a realização de campanhas de vacinação em massa de animais, em especial de cães e gatos;
II – a vacinação deve ocorrer de forma permanentemente, buscando atingir todos os distritos sanitários;
III – o registro de animais domésticos e dos dados de seus proprietários;
IV – a adoção de medida de controle das populações de animais domésticos, em especial de cães e gatos, através da prática permanente de esterilização efetuada por médicos veterinários;
V – Firma convênios com as entidades de proteção animal para abrigo dos animais errantes eventualmente recolhidos às entidades, com a promoção, esterilização, vacinação e medicação destes animais podendo colocá-los para adoção.
§1º – Os Centros de Controle de Zoonoses terão como política a adoção de medidas que os caracterizem como centro de saúde animal, devendo, inclusive, prestar assistência médico veterinária aos animais que dela necessitem, mantendo as instalações do Centro em perfeito estado de higiene.
§2º – Os Centros de Controle de Zoonoses não poderão ceder animas para realização de vivissecção ou qualquer outra forma de experimento.
§3º – O Estado criará, quando da regulamentação da presente lei, quatro Comissões Regionais de Proteção Animal, com a participação de entidades vinculadas ao setor e regularmente constituídas, com a finalidade de desenvolver as ações e objetivos previstos nesta Lei;
§4º – O estado deve adotar medidas que facilitem o acesso das entidades de proteção animal em recinto público onde existam animais.
Seção III
Da Posse e Guarda Responsáveis
Artigo 4º – O Estado deve fomentar incentivos para que os Municípios venham a promulgar e divulgar normas legais destinadas à proteção dos animais e a promoção do bem comum no que se refere ao convívio salutar com os animais, em conformidade com a presente lei, com efetiva participação das entidades de proteção animal.
Artigo 5º – O Estado e os Municípios realizarão campanhas permanentes públicas de conscientização com a participação das entidades de proteção animal para a posse responsável, através dos meios de comunicação de massa e de programas educacionais dirigidos às escolas públicas e privadas, levando em conta a promoção do bem comum e o bem estar dos animais.
Artigo 6º – O Estado e os municípios devem adotar políticas públicas que objetivem a prestação de assistência médica veterinária e esterilização gratuita a animais sem proprietários identificados e cujos proprietários comprovem sua condição de desemprego, baixa renda, pobreza, sendo a pobreza atestada através de declaração emitida pelo cidadão, facultado ao poder público a contra-prova;
Parágrafo Único – O estado e os municípios devem adotar uma política pública de assistência aos animais vítimas de maus-tratos, podendo, tal assistência, ser realizada, inclusive, através de convênio com as entidades de proteção animal regularmente constituídas;
Artigo 7º – É permitida a permanência de animais domésticos em condomínios residenciais, observada a legislação vigente.
Seção IV
Do Transporte e Trânsito de Animais Domésticos
Artigo 8º – É vedado transportar animais domésticos em transportes de massa intermunicipal no Estado da Bahia sem o certificado de vacinação anti-rábica.
Artigo 9º – É proibido manter animais embarcados por mais de 04 (quatro) horas seguidas sem o devido descanso e alimentação;
Artigo 10º – É proibido transportar animais em veículos destituídos de rede metálica ou outro equipamento de proteção que impeça a saída de qualquer parte do corpo do animal;
Capítulo II
DOS ANIMAIS DE CARGA E TRAÇÃO
Seção I
Das Condições dos Animais de Carga e Tração
Artigo 11º – O estado deve adotar política pública de proibição e fiscalização ao emprego de veículos de tração animal, a condução de animais com carga e o trânsito montado, em rodovias públicas estaduais, com grande movimento de veículos e pedestres.
Parágrafo Único – Consideram-se animais de tração os das espécies eqüinas, muares, asininas e bovinas.
Artigo 12º – Nas áreas e situações em que for permitido o emprego de veículos de tração animal, o seu uso deve obedecer ao fato do proprietário manter o animal devidamente ferrado, limpo, alimentado, com sua sede saciada e com boa saúde, por métodos que não lhes cause dor nem sofrimento;
Artigo 13º – Os veículos de tração animal não poderão utilizar peso da carga colocada em tais veículos, bem como diretamente nos animais que lhes cause dor ou sofrimento.
Artigo 14º – É vedado:
I - atrelar animais de diferentes espécies no mesmo veículo;
II - utilizar animal cego, enfermo, em adiantado estado de gestação, extenuado ou desferrado em serviço, bem como castigá-lo sob qualquer forma ou a qualquer pretexto;
III– utilizar objetos pontiagudos ou constituídos de forma a provocar dor e ferimentos no corpo do animal como forma de condução dos mesmos;
IV – surrar os animais como forma de obrigá-los a execução de trabalhos;
V - deixar animais de tração soltos transitando em locais públicos, vias públicas, rodovias e estradas vicinais.
VI – Sacrificar animais por qualquer método a pretexto de controle de zoonoses.
VII - Abandonar o animal, quando não houver mais interesse em sua manutenção.
VIII- Usar animais feridos, doentes e enfraquecidos ou em estado de gestação, em veículos de tração animal;
Capítulo III
DAS PENALIDADES
Seção I
Da Constituição das Penalidades
Artigo 15º – Constitui infração a inobservância de preceitos estabelecidos na presente lei, sendo tal inobservância considerada maus tratos aos animais e punida em conformidade com a legislação vigente, independentemente do pagamento de multa.
Parágrafo Único – Além do pagamento da multa o infrator poderá perder a guarda do animal, a critério da Comissão tratada no artigo 2º, §3º desta lei, proibido sempre o sacrifício do animal.
Capítulo IV
DAS DISPOSIÇÕES GERAIS
Artigo 16º – Fica o Poder Público, por meio de órgãos estaduais e municipais autorizado a realizar convênios e qualquer tipo de parceria com pessoas jurídicas da esfera não governamental no sentido de promover e ampliar condições favoráveis à aplicação da presente lei.
Artigo 17º – O estado deve adotar política pública de incentivos fiscais às empresas comerciais e demais entidades da iniciativa privada que comprovadamente destinarem recursos à promoção de ações em favor dos animais;
Artigo 18º – O estado deve facilitar às organizações não governamentais de proteção animal, legalmente constituídas, o acompanhamento de todos os atos praticados por agentes públicos em ações relacionadas a proteção animal ou que visem o cumprimento da presente lei
Artigo 19º – O estado deve promover ampla campanha de informação sobre o texto, assunto e o número da presente lei, especialmente em locais como delegacias de polícia, aeroportos e rodoviárias, órgãos públicos , escolas e comunidades de bairros.
Artigo 20º – O Poder Executivo regulamentará esta Lei no prazo de cento e vinte dias, contados de sua promulgação.
Artigo 21º – Esta Lei entra em vigor na data de sua publicação. Revogam-se as disposições em contrário.
Sala das Sessões, 30 de maio de 2011.
DEPUTADA MARIA LUIZA LAUDANO
JUSTIFICATIVA
Em fase recente ganha corpo no país o debate sobre a proteção animal. O esforço feito pelas instituições de proteção animal para sensibilizar corações e mentes que se encontram no poder público ou fora dele, tem sido decisivo. Essa mobilização vale para a proposição de normas e para a conscientização da população.
O aspecto ético de logo finca espaço no debate quando se aborda a questão da proteção animal. Seja o tema de estudos fisiológicos, através de Claude Bernard; seja na Inglaterra do século XIX, com o movimento de defesa dos direitos dos animais e contra a vivissecção; seja com a proliferação de sociedades protetoras de animais; seja na ampla participação de celebridades contra as condições infligidas aos animais na indústria de cosméticos e de alimentos, tão bem dissecadas em Animal Liberation, de Peter Singer; o debate é vivo e caloroso.
De outro lado está a comunidade acadêmica e científica, que cada vez mais se envolve no debate sobre os princípios morais e éticos que envolvem o uso de animais em pesquisa, inclusive para que ocorram mudanças de comportamento nos procedimentos adotados na experimentação científica que se vale de animais.
A preocupação com atos de crueldade cometidos contra os animais está presente na legislação brasileira de forma ainda incipiente. O inciso VII, do § 1º do art. 225 da Constituição Federal incumbe ao poder público "proteger a fauna e a flora, vedadas, na forma da lei, as práticas que coloquem em risco sua função ecológica, provoquem a extinção de espécies ou submetam os animais a crueldade."
A Lei nº 9.605, de 12 de fevereiro de 1998, considera crime, punível com detenção, de três meses a um ano, e multa, praticar ato de abuso, maus-tratos, ferir ou mutilar animais silvestres, domésticos ou domesticados, nativos ou exóticos (art. 32, caput). Segundo o § 1º do mesmo artigo, incorre nas mesmas penas quem realiza experiência dolorosa ou cruel em animal vivo, ainda que para fins didáticos ou científicos, quando existirem recursos alternativos.
A insuficiência de normas balizadoras que se relaciona ao trato para com os animais, contrapõe-se ao volume de problemas que são latentes no setor. Assim, este trabalho que resulta de ampla participação de diversas entidades de proteção do nosso estado, consubstanciado no projeto que ora colocamos ao apreço desta Casa, nos parece extremamente oportuno. Consideramos ser esse, também, o momento adequado para aperfeiçoar tais proposições, de forma a incorporar padrões internacionais e nacionais de respeito aos animais.
Exemplos no âmbito nacional não faltam. Os estados do Rio de Janeiro, São Paulo e Pernambuco já proibiram animais em circo, assim como mais de 40 municípios brasileiros, dentre eles Porto Alegre, Florianópolis e Campinas, no interior de SP. Há de outro lado vários Projetos de Lei que tramitam no Congresso Nacional e Assembleias Legislativas que visam normatizar a proteção animal.
No cenário internacional há legislação sólida sobre o tema na Austrália, Estados Unidos e países europeus. Nestes últimos, a legislação interna baseia-se em dois instrumentos: Convenção Européia sobre Proteção dos Animais Vertebrados Utilizados com Fins Experimentais e outros Fins Científicos, de 1986, e Directiva 86/609/CEE do Conselho, de 24 de Novembro de 1986, Vale ressaltar que, por força desses tratados, a Inglaterra e a França modificaram as normas já existentes, e os países onde não havia tratamento legal à questão, como Portugal e Espanha, elaboraram suas leis internas de proteção aos animais usados em experimentos científicos. Nos Estados Unidos, vigora uma lei sobre bem-estar animal (Animal Welfare Act, 1966), uma lei sobre animais utilizados em pesquisa médica (Health Research Extension Act , 1985), uma Política de Cuidado Humano e Uso de Animais de Laboratório (Public Health Service Policy on Humane Care and Use of Laboratory Animals, 1986), além de regulamentações no âmbito do Departamento de Agricultura e dos Institutos Nacionais de Saúde (National Institutes of Health).
Reza a Constituição do nosso estado:
“Art. 214, incisio VII - proteger a fauna e a flora, em especial as espécies ameaçadas de extinção, fiscalizando a extração, captura, produção, transporte, comercialização e consumo de seus espécimes e subprodutos, vedadas, na forma da lei, as práticas que coloquem em risco sua função ecológica, provoquem sua extinção ou submetam os animais à crueldade;” (grifos nossos)
O presente projeto se coaduna com os princípios constitucionais acima elencados, dando-os efetividade. Por tais razões, aguardamos pleno apoio desta Casa à criação de tal legislação, sacramentando um legado humanitário e histórico deste Poder para com as gerações de baianos de hoje e todo sempre.
Sala das Sessões, 04 de maio de 2011.
DEPUTADA MARIA LUIZA LAUDANO
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